terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Nesta margem, entre as janelas

A todos aqueles que torcem o nariz de cada vez que eu lhes falo destes projectos: estejam mesmo descansados que já foi há alguns dias e ainda cá estou, direitinho, sem mazelas nem sequelas, patologias, queixas ou demais sinais indicadores da falta de atenção daqueles senhores de colete e autorização judicial para bisbilhotar, apreender e encerrar.

Sim, estou bem, deixem lá o nariz sossegado e baixem o sobrolho porque vou mesmo dizer a palavra proibida.

CLAN-DES-TI-NO

Eu pecador me confesso: finalmente consegui transpor a porta apartamental de um dizem-que-há-praí-uma-catrefada-mas-ninguém-sabe-onde-é-que-aquilo-é-só-para-eles restaurante de comida chinesa na clandestinidade (não, não é aquele da Mouraria sobre o qual aqui já escrevi e que oficia de porta aberta num apartamento recuperado com verbas do RECRIA), fechado aos olhos da cidade distraída e quase reservado a conterrâneos do dono.

Eu pescador me confesso: apanhei um belo almoço e trouxe como bónus um local simpático onde me senti bem e onde quero voltar para palatinar as outras ofertas da casa.

Para primeira experiência, entendi ser ousadia suficiente a frequência de um lugar com falta de certificação (certificação... bah! tanta coisa que por aí anda "certificada" que mais valia dedicar-se à apanha de agrião...) - reduzindo-me pois, no que aos pratos escolhidos disse respeito, ao conservadorismo do reconhecível.

Uma sopa "agro"-picante,


um tofu caseiro, com legumes e carne picada,


e beringela salteada com molho vermelho.


É difícil um diálogo profundo sem se saber mandarim e, portanto, não tenho muitas pistas sobre a composição do molho. Limitar-me-ei a informar que foi um alfaiate perfeito para enroupar a textura da beringela, sempre tão cheia de corpo e tão fraca de sabor.

Chá verde fluente.

Comida confortável, a trazer na sua génese um respeito pela confecção que se traduz na positiva sensação de bem-estar que se prolonga por toda a refeição. Doses gargantuescas e preços tão adaptados à penúria anunciada que parecem gralha.

Ficam-me a faltar os ensopados de tendões de vaca e de rabo de vaca; o bambu salteado com legumes (preservados em picles); o tofu extra picante; as tripas salteadas com cebolinha verde; o inhame picante salteado; o lingueirão salteado com cebola e as lulas salteadas com aipo; o caranguejo negro em molho vermelho; as pernas de caranguejo fritas com ovo; o cantaril cozido a vapor; o feijão de soja cozido, a salada de algas; os camarõezinhos cozidos que vou desbravar nas próximas idas. E se o Bourdain cá vier brevemente, convido-o e arrisco o chispe perfumado, o bucho de borrego, as patas brancas de galinha com molho, a cabeça de medusa salteada.

Num dia mais inspirado de paixão, irei de mergulho (apneia e não scuba) em delicatessen tão badaladas como o queijo de tofu de SuZhou, os ovos preservados em soja, o pepino chinês envinagrado, os picles de nabo.

Definitivamente recomendado a quem vier por bem.

Restaurante chinês
Rua , nº , Lisboa
Tel. , (não aceita reservas)
2ª a Domingo, preferencialmente ao jantar.

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