terça-feira, 31 de julho de 2012

Verão

A culpa é deste tempo langoroso que convida a vários ócios. Comer, beber e amar, como diria Reis mas também olhar a luz da cidade - não a da soturnidade, não a da melancolia - essa luz que transforma Lisboa em coisa rara, em coisa amada, em objecto do desejo.

Objecto do desejo ainda mais profundo quando olhado de longe - tão longe mas tão perto!



Um lento vinho e lusas pataniscas com arroz de feijão.




Who wants to be a millionaire?

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A hora portuguesa

Foi em tempos La Hora Española (assim como a selecção homónima vem tendo a sua hora desde há quatro anos) e foi nela que fui introduzido à mojama, essa versão huelvense da nossa mui algarvia muxama. Espaço muito bem adaptado à função - quase parece criado de raiz tal a identificação - fazia sentir aos seus frequentadores uma aparência de realidade: como se, apesar dos fracos conhecimentos dos produtos que apresentava quem servia, se estivesse mesmo na Andaluzia e não na lusitana Lisboa.


Agora está em mãos portuguesas que lhe acrescentaram um ar bem nacional de descontração e algum improviso, a par de uma mundivisão que só poderia ser nossa: no dia em que lá estivemos houve dança do ventre, com um quase pedido de desculpas por não termos apanhado a habitual sessão de fados, variando a banda sonora dos intervalos entre José Cid e música gitana. Todo um mar de sensações.



Quanto à comida, um mix de tapas e petiscos, genericamente bem feitos, com apelo suficiente para acompanhar a noite.

  

  

Serviço amador mas com toda a vontade do mundo em aprender com a opinião dos clientes. O que, considerando os exemplos  que por aí campeiam, não é um mau começo.

É uma experiência engraçada, a tentar de quando em vez, para um bom momento de descontração e uma não menos boa prova gastronómica.

La Hora Española
Calçada Marquês de Abrantes, 58
1200 - 719 Lisboa

Dois livros

Começam a chegar os primeiros presentes do Gastraniversário. Directamente da amazon.uk vieram o mais recente livro de Alain Passard e uma outra jóia de interesses do Heston Blumenthal, dois substitutos das sobremesas que não como.

Sobejamente conhecido no mundo gastronómico pela radicalidade da aposta em cartas exclusivamente vegetarianas que efectuou no se L'Arpège, Passard revela neste livro 48 receitas de pratos principais e de sobremesa. Combinações inusitadas, vegetais menos conhecidos, coisas de abrir a boca e o apetite, para nos dar ideias e não sair da ideia. Tomate e mozzarella com baunilha e hortelã-pimenta; ervilhas com romã e amêndoa (com um toque de tomilho); espargos e peras com um toque de red sorrel (azeda?); salada mesclun com laranja confitada e molho de soja; beringela com molho de caril verde; cenouras púrpuras com manjericão, canela e molho de soja; pêssegos com limão e açafrão; ananás com molho de azeite, mel e lima, são alguns exemplos.



Já o livro de Blumenthal é um misto de apresentação de técnicas e receitas, do tipo "cozinha contemporânea apresentada às crianças e ao povo" como soía dizer-se. Autodidacta de formação, levado aos píncaros do estrelato culinário e mediático pela radicalidade e criatividade de muitas das suas propostas, a sua extrema curiosidade fica bem à vista na forma como exaustivamente procura explicar todos os pormenores das confecções e dos preparos.

É um perder de horas a ler e reler, a aprender, a confirmar, a retirar inspiração para novos caminhos.

Assim, é bom celebrar a entrada no terceiro ano de vida. Agradecida, senhora Amazona!

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Clara Ajuda


É um fim de tarde que se presta a isso: a canícula que impera menos opressiva e aquele pedaço de verde que surge ao fundo, passado o bar inglês e a relaxante sala de jantar, pronto a ser exercido como fresca oposição. Depois, na mão, uma flute do rosé da Herdade da Ajuda - em prova -, dois dedos de conversa com a anfitriã, e uma e outra tapa para contrabalançar e fazer boca para a noite.


Amanhã, a partir das 17:30, o que promete ser uma boa experiência, no

CLARA Jardim Restaurante
Campo dos Martires da Pátria nº 49,1150-225 Lisboa

Preço por pessoa 7,50€
Reservas 218853053 / 969019898

Cantão a cem

Terceira e última paragem do périplo pela grande Lisboa em busca de restaurantes cantonenses/macaenses de referência.

No Cacém, na zona temporalmente intermédia entre o pequeno burgo dos anos 40/50 e a explosão urbanística do final do século, antes da intimidante intervenção Polis. Deprimente arquitectura a lembrar o quanto necessitados andamos enquanto povo de uma lavagem de olhos em paragens de maiores consciência e exigência de estilo.

Em sobreloja de multiespaço comercial, um lugar de comer que seria mais um entre iguais não fora a raridade de muitos dos pratos saídos da sua honesta cozinha.


Decoração sem história (será que há um fornecedor único de interiores para restaurantes asiáticos?) a cumprir todos os clichés orientais para ocidentais verem. Kuaizi (pauzinhos), loiça, mais do mesmo, não é por aí que as coisas animam.


Começaram para mim a animar na sopa ácido-picante, a qual, mesmo "importação" de Sichuan, é sempre bem-vinda para os sedentos de sabores mais próximos do limite da dor. Sem exagero mas sem contemplações, um bom início.


Entrando nos dim sum, os pak choi kok (dumplings de camarão e couve chinesa) criação fora dos caminhos mais tradicionais, a cor da massa glutinosa tingida pelo verde do pak choi e um recheio grumoso que surpreende mas se torna agradável pelo contraponto à lisura do invólucro.



Revolução! Da massa lisa e cozida a vapor para um recheio de carne picada, cogumelos chineses e amendoim envolto em massa frita. Inusitados e agradáveis estes ham sui kok a demonstrar a multiplicidade de alternativas que esta bite size food apresenta.



Para terminar o capítulo em beleza, um prato de chu cheong fan rolos de farinha de arroz cozida em vapor, tradicionalmente comida de rua para pequenos-almoços en passant. Pequenos almoços? Pequenos almoços. Temperados com sementes de sésamo e molho de amendoim e banhados em molho hoisin. É um gosto que se desenvolve com a prática, a massa "mastigativa" (pensem na consistência da pastilha elástica menos o sabor; aliás sem nenhum sabor) muito fora dos hábitos nacionais.



Terminou-se com ngau yuk chao ho (qualquer coisa como massa larga e lisa (hoabreviatura de ho fan) frita (chao) com carne de vaca (ngau yuk)), um prato e um sabor mais próximos do reconhecível mas ainda assim a destacar-se pela originalidade da massa.


Vá-se em excursão ao Cacém, pois. Com palas para o caminho não impressionar e de preferência a optar pela primeira entrada do IC19 (para quem vem de Lisboa) - ele há agressões urbanísticas que nos estragam o apetite...

Restaurante Dim Sum
Rua António Nunes Sequeira, nº 14A, Agualva - Cacém (frente à escola secundária)
Tel. 918 012 330 / 21 913 58 48
www.facebook.com/restaurante.dimsum

quarta-feira, 11 de julho de 2012

A tradição é um caminho para o futuro

(Fotograma retirado do filme. Fonte: Eater.com)
Descobri este video, idealizado o ano passado pelo grande Massimo Bottura.

(Origem: Eater.com. Ver aqui para melhor qualidade)

Como diz o editor da Eater.com de onde o retirei, "O que é que se obtém quando se juntam um dos maiores chefes do mundo, cinematografia de absurdo bom-gosto e a música de Surfjan Stevens, Fleet Foxes e Bob Dylan? Il Ritorno, o hino do chef italiano Massimo Bottura à Emilia-Romagna e à sua herança cultural."

Vale a pena ver as imagens e reflectir sobre esta dedicação que cada vez mais chefs de renome demonstram às suas origens e às raízes culturais das suas regiões. Por aqui, andamos no carro vassoura (como sempre) deste necessário - obrigatório! - retorno às origens. E para que entusiasmos efémeros não redundem nos descalabros costumeiros, será talvez sensato recuperar todo um tecido produtivo agrícola devastado por acordos PEC mal conduzidos para só depois, e na sequência de um movimento que deverá ser interior e não aplicado à força por um qualquer governante convertido à moda, chegar a valorização, incentivo, publicitação global dos nossos produtos característicos. Que não se iludam os arrivistas: os encómios que aqueles vêm recebendo dos grandes chefes estrangeiros (já agora: que tal reflectir igualmente sobre o facto de terem sido os profissionais imigrantes os primeiros a defenderem os produtos nacionais?) que por aqui laboram não são sinal de pujança, antes de uma particularidade que é excepção e deverá ser preservada e desenvolvida antes de atirada ao mundo sem a necessária consolidação. As pirâmides começam-se pelas fundações, não é?

Em entrevista publicada ontem (e que despoletou a descoberta do video) refere Bottura que, por causa deste video, o governo regional está a investir 18.5 milhões de euros no delta do Pó. E por causa da visão de Bottura (e do seu apoio), a Faculdade de Agricultura de Castelfranco terá um módulo de culinária de modo a aproximar os futuros chefs da agricultura: nela se produzirão Parmigiano-Reggiano, Lambrusco e vinagre balsâmico. (leia-se com atenção o programa e objectivos do curso - bolas, também quero cá uma coisa destas!!!)


"Acho que um chef que vá para a cozinha com mãos que estiveram a trabalhar a terra, com o cheiro a leite no ar, terá um maior respeito pelos ingredientes."

Para um chef que tem sido recorrentemente acusado pelos seus conterrâneos mais zelotas, de não respeitar a tradição, é uma bela frase.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Lisboa toda nossa



Vale principalmente pela vista, pelo prazer de, com o rio aos pés e Lisboa nos olhos, deixar correr as últimas horas do Sol estival, o progressivo alaranjar do horizonte e sentir instalar-se uma paz apaziguadora de todas as agruras contemporâneas.

A comida não é de atravessar o mundo para a descobrir mas é suficientemente agradável para não contrastar com a paisagem: algumas referências regionais portuguesas - rojões, arroz de cabidela, sopa de cação -, para além do inevitável peixe grelhado variado.






Recomendo cacilheiro até ao sítio homónimo e a lenta caminhada até ao restaurante, junto ao rio e às ruínas de tempos mais afortunados, em equilíbrio pausado entre a capital que a distância torna sem mácula urbanística e o lamento de como a pequenez dos homens impede o aproveitamento de qualidade de todo este espaço.



Para quem vem do Sul, há um parque mesmo junto à estação, sendo a alternativa para os mais entusiastas a descoberta do caminho terrestre para o elevador panorâmico, perdido nas alturas da Almada velha.


A empregar de preferência ao final do dia, usando o telefone para a recomendável reserva de uma das mesas da frente.

Ponto Final
Cais do Ginjal 72, Cacilhas
Tel.: 212760743

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Tomo dreams of veggies


A Quinta do Poial é, já se sabe (e quem não sabe que se despache a conhecer, num qualquer restaurante excepcional ou na sua mesa se fôr aos Sábados ao Príncipe Real) um centro de excelência agrícola.

O Tomo é, já o Miguel Pires sabe (e quem não sabe que se despache a conhecer o seu poiso ali na Avenida dos Bombeiros Voluntários em Algés) um centro de excelência culinária.

Juntem-se os dois à esquina de Azeitão, com mais uns pozinhos de mãos ilustres e cabeças pensantes, abram-se as portas a uma vintena de convivávidos de boas experiências e aqui está a primeira edição do "VAI AO POIAL!" uma experiência iterativa que junta a descoberta de uma exploração agrícola biológica com a ajuda na apanha das matérias que irão ser utilizadas no almoço e ainda a aprendizagem de modos de as confeccionar. Um trinta-em-um.

Aqui ficam as imagens de uma bela tarde.

1º ACTO:
A visita, a descoberta, a colecta.




















2º ACTO:
Tomoaki dreams of vegetables















INTERMEZZO:
Ceci n'est pas une pipe!


3º ACTO:
Tomoaki, Luís, Paulina, Miguel, Diogo: imaginação e saber ao serviço da humanidade


























4º e last but not Liszt
Almoço. Almoço? Pois. Comi-o.